quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Punks Muçulmanos




Por Brian Whitaker (19 de março, 2007)
Traduzido por Sylvia Bojunga


Nesta semana foi publicado no Reino Unido um livro sobre muçulmanos, o qual, posso afirmar com segurança, é absolutamente singular. É uma novela intitulada “The Taqwacores”.

Embora eu tema que nossa elite literária possa desprezá-la e que os muçulmanos mais conservadores sintam-se ofendidos por ela, a obra já conquistou uma seita nos Estados Unidos e algum reconhecimento por aqui no The Sun. Nas palavras do editor: "The Taqwacores está para a literatura assim como o Sex Pistols foi para a música."

Aguardo a chegada do livro com muito interesse porque, por acaso, eu ajudei a trazê-lo para a Inglaterra... mas talvez eu deva voltar ao início.

O autor, Michael Muhammad Knight, pode ser descrito como o Hunter S. Thompson da literatura islâmica. Americano de descendência católica irlandesa, converteu-se ao Islã aos 16 anos lendo a biografia de Malcolm X. Aos 17, partiu para o Paquistão, e passou seis horas por dia estudando religião, entrou em contato com refugiados afegãos e quase se juntou aos combatentes chechenos. Porém, mudou de idéia, retornou aos EUA, desiludiu-se e transformou-se em um punk muçulmano.

Caso você esteja imaginando o que é um punk muçulmano, ou como se tornar um deles,
eu também não estou inteiramente seguro, mas, no caso de Knight, significa ser "aquele cara em uma festa que fica num canto e fala merda sobre todo mundo."

Isso inclui fazer o diabo com o establishment muçulmano. Ele reivindica para si o fato de ter feito a má fama de Yusuf Islam (ex-Cat Stevens) e outras celebridades muçulmanas, e escreveu uma série de reportagens sobre as conferências da Sociedade Islâmica da América do Norte (2003, 2004 e 2005) em estilo que faz lembrar a revista Rolling Stone.

Em uma entrevista em 2004, ele destacou as semelhanças entre a comunidade muçulmana e (você nunca adivinharia) George W Bush: "Ele é anti-aborto, anti-gay e defende tudo o que faça do Islã típico algo tão duro e vil como o Cristianismo típico."

Dizem que Knight passou a visitar sua mesquita local somente à noite, quando não havia mais ninguém por perto, e eventualmente conseguia uma chave que permitia que dormisse lá. Foi durante as noites na mesquita que ele começou a escrever histórias e seu primeiro livro “Where Mullahs Fear to Tread” (Onde os mulás temem pisar) – concluído aos 19 anos – , que teve a honra de ser banido por autoridades religiosas em Singapura.

Seu segundo livro, “The Taqwacores”, é a história de alguns punks muçulmanos em Buffalo, Nova Iorque, dividindo, juntos, uma mesma casa. A sala de estar tem múltiplas funções, como local para orações e espaço livre para festas – para os primeiros propósitos, eles arrancaram alguns tijolos da parede para servir como um oratório voltado para Meca. Sua vida em comum mistura sexo, drogas e orações em quantidades aproximadamente iguais, somadas à devoção quase-religiosa pelas bandas punk islâmicas taqwacore – o tipo de músicos que perdem suas convicções de rua no momento em que começam a se tornar populares.

Este é o ponto no qual a ficção se torna realidade, porque na época em que o livro foi escrito a música taqwacore não existia realmente. Agora existe, como resultado do livro. A palavra taqwacore é uma combinação de hardcore (som de rock pesado) e "taqwa" – um termo árabe geralmente traduzido por "devoção".

Hoje, a banda taqwacore mais conhecida é “The Kominas” (uma palavra Punjabi que significa bastardos), e algumas de suas letras estão aqui. Uma de suas canções mais polêmicas, “Rumi Was a Homo” (Rumi era homossexual), ataca Siraj Wahhaj, um proeminente imã (líder muçulmano) do Brooklyn acusado de homofobia.

Embora “The Taqwacores” seja agora estudado em cursos em diversas universidades americanas, levou algum tempo para que o livro fosse formalmente publicado. No início, Knight fez fotocópias dele na loja Kinko's local e as distribuiu pessoalmente nos estacionamentos das mesquitas.

Por fim, o livro foi vendido pelo correio por meio do Alternative Tentacles, um selo de discos da Califórnia, que vende sob o provocativo slogan: "Mantendo a pátria insegura desde 1979".

Eu descobri o livro um dia enquanto navegava na internet, encontrei um fragmento, e pedi uma cópia. Quando chegou... bem, eu nunca li nada parecido, antes ou desde então.


No início do ano passado, eu estava conversando em Londres com uma amiga que trabalha com edições e contei a ela sobre “The Taqwacores”.

"Mmm ... parece interessante," ela disse, e prometeu ler. A próxima coisa que eu ouvi foi que alguém de sua equipe tinha ido para os Estados Unidos, procurado Knight e assinado com ele os direitos de publicação para a Inglaterra.

Então agora está aqui. Estou um pouco apreensivo mas espero que as organizações muçulmanas inglesas sejam sensíveis e pensem duas vezes antes de protestar. Elas reclamam - corretamente – por serem estereotipadas pela mídia, e “The Taqwacores” é um poderoso antídoto para isso (o que é uma boa razão para que seja lido e circule o mais amplamente possível).

A leitura é fácil e engraçada mas, em outro nível e sem se alongar sobre o ponto, o livro é também profundamente desafiador. Ele aborda – de uma forma chocante mas essencialmente positiva – questões de identidade que são enfrentadas, em alguma medida, por todos os jovens muçulmanos que crescem no Ocidente.

É claro, haverá gente que insistirá que os personagens do livro não são “verdadeiros” muçulmanos. Estou adivinhando, mas acho que este é o ponto principal que Knight desejava levantar. Como você define um “verdadeiro” muçulmano? Em que bases? E alguém tem o direito de julgar?".


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